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A arquitetura aplicada a comunicação da identidade corporativa

        Dentre os recursos utilizados para comunicar e construir a identidade de uma corporação a arquitetura e o design se destacam como ferramentas que existem em constante comunicação na elaboração da imagem que será transmitida às pessoas. Um dos primeiros exemplos do uso destes recursos surge muito antes do conceito de corporação. Há muitos séculos atrás, durante o império romano, foram construídas edificações as quais influenciavam na população a supremacia romana e a lealdade ao império.  Em seu livro “Objetos de Desejo”, Forty (2007) discorre no capítulo “Design e identidade corporativa” acerca da utilização das edificações em estilo romano como dispositivos visuais os quais fortaleciam a identidade política em determinadas regiões:

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“[...] à medida que os romanos conquistavam territórios e povos e os incorporavam ao seu império, edificações em estilo romano ajudavam a gravar nas populações submetidas à supremacia do direito e do governo romano, ao mesmo tempo que também ajudavam os colonos romanos em lugares distantes do império a não esquecer sua lealdade para com Roma e a não se identificar demais com as populações nativas ” (FORTY, 2007, p. 301).

Arquitetura Romana

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         Alguns séculos depois, durante a Idade Média, uma soma da arquitetura românica e de suas fontes de inspiração foi utilizada de forma semelhante na abadia de Cluny e exerceu profunda influência na cristandade estimulando nos monges a supremacia e os princípios da ordem religiosa monástica católica de Cluny acima dos interesses mundanos.  O estilo e os elementos do edifício remetiam com perfeição a extensão da ordem de forma que agregava mosteiros de toda parte e também reunia em cada região elementos para a sua arte. Dessa forma, qualquer monge, independentemente do seu lugar de origem encontrava em Cluny alguma coisa que lhe recordava a arte da região de onde viera.

    Seguindo a influência dos clunistas, no século XII, um estilo de arquitetura que posteriormente daria origem ao estilo gótico foi empregado pela ordem cisterciense, na abadia de Clairvaux, um novo movimento de reforma monástica. Segundo Forty (2007) tal estilo arquitetônico possuía um padrão rigoroso o qual se reproduzia nos países onde estabeleciam suas bases. A arquitetura das casas possuía um formato semelhante e, portanto, facilmente distinguível que marcava nos monges a sua fidelidade e identificava cada abadia como cisterciense:

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“Havia vantagens óbvias nessa política arquitetônica: tornava o monasticismo cisterciense e suas casas fáceis de distinguir dos mosteiros atrasados e não reformados, e marcava nos monges e abades sua fidelidade a ordem, cuja autoridade se estendia através das fronteiras nacionais e políticas” (FORTY, 2007, p. 302).

      Forty (2007) observa que as políticas de design de grandes empresas, como a multinacional IBM, foram desenvolvidas com o mesmo objetivo que arquitetura românica para os monges e a arquitetura gótica para os cistercienses, as quais buscavam tornar a identidade da companhia clara para o público e os empregados através do uso da arquitetura, bem como de outros recursos, e ajuda-los a reconhecer a identidade da corporação como um todo.

Abadia de Cluny

Mosteiro de Alcobaça - Arquitetura Cisterciense

      Partindo para o contexto comercial, é possível encontrar uma analogia para a análise de Forty (2007) no aparecimento das lojas de departamentos, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, as quais exibiam seu nome e seus produtos no ambiente externo da loja para impressionar os consumidores. Os dispositivos visuais presentes nestes estabelecimentos, tais como as fachadas e vitrines, os interiores, o mobiliário, a decoração, a sinalização e as paredes podem ser empregados a estrutura arquitetônica de um edifício, por exemplo, ou como forma de ornamento. Tais formas e composições podem resgatar significados na memória do interlocutor, bem como transmitir sensações. No caso das lojas de departamentos, os produtos expostos introduzem o processo de comunicação da identidade não só do ambiente, como também da identidade coorporativa da empresa.

      Durante o início do século XX, pequenas lojas empregavam artistas e designers cuidar dos detalhes do espaço. A joalheria Boutique Fouquet, de Paris, teve seu projeto concebido pelo designer e ilustrador Alphonse Mucha, o qual executou minuciosamente a composição da fachada e os interiores, os móveis, vidros, afrescos e as ferragens, e transformou a estrutura do estabelecimento em uma obra de arte. Desta forma, pode-se apontar tanto que já se existia uma relação de integração do design com a arquitetura e que a utilização dos dispositivos resultantes destas duas áreas funciona como ferramenta na comunicação da essência da loja.

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        A arquitetura aplicada a comunicação da identidade corporativa também está presente no exemplo central para a argumentação de Forty (2007) e de Meggs (2009), no livro “História do Design Gráfico”. Os autores se baseiam nos problemas que foram resolvidos pelo uso do design no sistema de transportes de Londres, a London Transport. Os autores comentam que à medida que Frank Pick, estatístico e advogado, ocupou um papel de grande importância na administração da rede de transportes de Londres, por volta de 1920 a 1940, sua política de design se debruçou sobre a identidade visual e coorporativa aplicada a arquitetura das estações, dos trens e dos ônibus, das plataformas das estações, da sinalização e interior dos vagões os quais foram cuidadosamente projetados visando transmitir a identidade da empresa. Conforme Forty (2007):

Fachada da Boutique Fouquet

“Essas mudanças ocorreram aos poucos até que, por volta de 1939, a característica mais notável da London Transport era que todas as suas partes -  estações, ônibus, trens, cartazes, assentos e cestos de lixo – eram identificáveis como propriedade de uma única organização” (FORTY, 2007, p. 306).

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      Durante o período entre as duas guerras, cerca de 1923 a 1950, a identidade dos espaços das novas estações foi projetada através do trabalho do arquiteto Charles Holden e de outros empregados pela London Transport os quais seguiram os princípios de Pick de que cada elemento deveria possuir relação visual com todo o resto. Como parte da arquitetura das estações e, consequentemente, da identidade do sistema como um todo, as placas de sinalização, o medalhão (the roundel), e a fonte tipográfica, criada por Edward Johnson em 1916, o mobiliário e os cartazes artísticos empregados nas paredes das estações receberam bastante destaque quanto a política de Pick.

Interior das estações

      O medalhão vermelho e azul foi adotado para compor a sinalização das estruturas arquitetônicas da companhia e se tornou o símbolo do metrô o qual foi utilizado em todas as placas e informações das estações tornando-se um elemento fundamental para a atribuição de uma identidade visual e coorporativa ao sistema. O símbolo posteriormente veio a ser redesenhado por Edward Johnston na década de 1910, que incorporou uma nova fonte tipográfica exclusiva, encomendada por Pick e desenvolvida por ele, a qual foi utilizada em todas as propriedades do sistema:

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“Johnston projetou uma nova versão da sinalização e da marca das estações, usando sua nova fonte sobre uma barra azul à frente de um círculo vermelho em vez de um disco sólido. Essa marca do metrô de Londres é usada ainda hoje, incorporando refinamentos feitos em 1972” (MEGGS, 2009, p.309).

O medalhão

      Graças as mudanças implementadas por Pick os londrinos puderam observar todas as mudanças realizadas na aparência do transporte público e a adoção de um design moderno que representava os objetivos da organização e que transmitiu a impressão de integração completa entre suas partes.

      Como é possível perceber, é impossível discordar que a arquitetura possui um papel relevante como instrumento para a comunicação de uma identidade, seja ela de uma corporação ou não. Vale ressaltar que o papel da arquitetura se dá de forma conjunta com outras áreas, dentre as quais o design se destaca também como um dos principais fatores que sem os quais, por exemplo, as mudanças ocorridas no sistema de transporte londrino talvez não fossem possíveis.

Texto desenvolvido por Eliza Maria Silva de Morais para a disciplina Introdução ao Estudo do Design - Universidade Federal do Rio Grande do Norte - Departamento de Artes - Bacharelado em Design - Novembro de 2019. O texto colabora com o projeto de extensão “Blog Estudos sobre Design”, coordenado pelo Prof. Rodrigo N. Boufleur (http://estudossobredesign.blogspot.com ).

Referências

BLOG GLORIA DAIDADE MEDIA. Zelo pela tradição na arquitetura de Cluny. Disponível em: https://gloriadaidademedia.blogspot.com/. Acesso em: 8 nov. 2019.

FORTY, Adrian. Objetos de Desejo. São Paulo: Cosac Naify, 2006.

MEGGS, Phillip. História do Design Gráfico. São Paulo: Cosac Naify, 2009

ONOFRE, Carlos Eduardo Lins. Espaço e identidade visual: uma investigação sobre soluções de design para empresas. 2012. 91 f. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação, 2012. Disponível em: <http://hdl.handle.net/11449/89841>

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Texto redigido por Renan Felipe Pereira de Oliveira para a disciplina Introdução ao Estudo do Design – Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Departamento de Artes – Bacharelado em Design – Novembro de 2019

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